quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Nação gêge-nagô Ilê Aiyê Salvador




Por Antônio Moreno*



O Ilê Aiyê, o primeiro bloco afro da Bahia, comemora 37 anos neste Carnaval reafirmando sua bandeira de preservar, valorizar e expandir a cultura afro-brasileira. Este ano, o bloco desfila com um tema que promete beleza e reflexão: “Negros do Sul – Lá também tem”.  A idéia é desvendar e divulgar a contribuição dos negros na formação social, cultural e política dos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. O conceito vigente é que de esses locais têm como única característica uma população branca e elitizada, com forte influência da cultura européia, decorrente da imigração ocorrida por ocasião da Segunda Guerra Mundial.  Mas a História comprova com fatos a grande participação dos africanos e afro-descendentes nas formações sociais, política e cultural dos territórios sulistas.
 
Ilê Aiyê nas ruas

Ilê Aiyê estará presente no carnaval da Bahia durante três dias:
Sábado - dia 18 de fevereiro, das 20h às 22h, concentração na Rua do Curuzu, com o tradicional ritual de celebração. Em seguida, o bloco desfila pelas ruas da Liberdade, bairro onde vive a maior população negra do país. A partir das 2h (madrugada de domingo), sai em desfile do Campo Grande, passando pela Avenida Sete até a Piedade.
2ª feira - dia 20 de fevereiro, 18h, concentração na Rua Araújo Pinho (Canela) para o desfile previsto a partir das 19h no circuito Osmar (Campo Grande), descendo a Avenida Sete até a Praça Castro Alves, retornando pela Rua Carlos Gomes até os Aflitos.
3ª feira -  dia 21 de março, às 18h, concentração na Rua Chile. O cortejo começa na Rua Chile, passando pela Praça Castro Alves, seguindo pela Rua Carlos Gomes e retornando para a Avenida Sete na altura da Casa de Itália. 
Ilê Aiyê e sua história
Primeiro bloco afro da Bahia, o Ilê Aiyê inicia sua história em 1º de novembro de 1974, no Curuzu-Liberdade, bairro de maior população negra do país, onde vivem cerca de 600 mil habitantes. O bloco nasceu no espaço sagrado do Terreiro de Candomblé de nação gêge-nagô Ilê Axé Jitolu, comandado por Mãe Hilda dos Santos, falecida em setembro do ano passado.
Apesar de profano, o Ilê Aiyê herdou os fundamentos e princípios do Candomblé, como a compreensão da convivência social, o respeito aos mais velhos e o aproveitamento da simbologia para suas canções, toques, adereços e figurinos, sem ferir os fundamentos religiosos. Como uma agremiação da comunidade negra, firmou-se como um dos principais agentes no resgate da auto-estima e elevação da consciência da população negra da capital da Bahia.



Ilê Aiyê aposta no social


O Ilê Aiyê é muito mais do que uma entidade carnavalesca. É reconhecido pela sua importante participação social, através de ações voltadas para a inclusão do povo negro da Bahia. Os projetos funcionam no Centro Cultural Senzala do Barro Preto (na sua sede, no Curuzu- Liberdade). Um dos projetos mais importantes é a Escola Mãe Hilda, fundada em 1988, que atende a cerca de 200 alunos da alfabetização à 4ª série do ensino fundamental e tem como diferencial, no seu currículo, justamente o ensino da cultura negra. A Escola de Percussão, Canto, Dança e Cidadania Band'Erê, por sua vez, também vem contribuindo para a formação musical e cidadã de cerca de 100 crianças e jovens.
 
A Escola Profissionalizante do Ilê Aiyê, em parceria com a Petrobrás e a Secretaria de Desenvolvimento Social do Estado da Bahia/Sedes, promove a capacitação de cerca de 730 jovens por ano, com uma média de inserção de 25% desses profissionais no mercado de trabalho. Oferece uma gama de cursos gratuitos para jovens de 17 a 25 anos, a exemplo de Informática, Ajudante de Cozinha, Dança, Estética Afro, Corte e Costura Industrial, Fabricação de Calçados e Bolsas, Operador de Telemarketing e Eletricidade Predial. Além disso, o Ilê desenvolve diversas atividades e oficinas e mantêm, em sua sede (a Senzala do Barro Preto), biblioteca especializada, infocentro, estúdio e o grande espaço para shows, ensaios, festas e eventos.



Ilê Aiyê e sua música

O movimento rítmico musical deflagrado pelo Ilê Aiyê na década de 70 foi responsável por uma revolução no carnaval baiano. A partir desse movimento, a musicalidade do carnaval da Bahia ganha força com os ritmos oriundos da tradição africana, favorecendo o reconhecimento de uma identidade peculiar baiana, marcadamente  negra. Artistas como Caetano Veloso e Gilberto Gil foram os primeiros a gravarem músicas do Ilê Aiyê e enaltecerem a importância do bloco afro para o Carnaval e a musicalidade baiana.

Como não poderia deixar de ser, o seu presidente, Antonio Carlos Vovô, resolveu criar a própria banda do bloco: a Band’Aiyê, que já  revelou vários artistas de sucesso, como Beto Jamaica e Lazzo. E deixou também sua marca em participações nos Cds de artistas consagrados no mundo, como Bjork (Finlandia), Yerba Buena (Cuba - EUA), Nass Marraketh (Marrocos), Daniela Mercury (Brasil), Arto Lyndsay (EUA), Cheikh Lô Lamp Fall (Senegal), Martinho da Vila (Brasil) e Salvador Negro Amor (Brasil).




Ilê Aiyê e sua dança
A dança afro é uma das características fundamentais do Ilê Aiyê. O Corpo de Dançarinos é formado por aproximadamente 30 pessoas, sob a coordenação da diretora do Ilê e estilista Dete Lima, responsável também pelo design e organização da Festa da Beleza Negra e da produção estética do concurso da Deusa do Ébano. 

Os elementos da ancestralidade africana, guardados pelos Terreiros de Candomblé, são as bases que sustentam a dança afro do Ilê. Fundamentada no Ijexá, suas coreografias encantam a todos que apreciam esta arte e atrai cada vez mais adeptos. A cada ano o Corpo de Dança aumenta, pois os adolescentes oriundos da Banda Erê são incorporados ao grupo, além de novas dançarinas oriundas do concurso da Deusa do Ébano.

Ilê e sua Deusa

A Deusa do Ébano 2012 – rainha do Ilê no Carnaval – é a funcionária pública Edjane Nascimento, 27 anos, eleita na Noite da Beleza Negra, realizada no dia 28 de janeiro, na Senzala do Barro Preto. Doze candidatas, selecionadas entre 45 inscritas, concorreram ao título, que garante à vencedora representar a entidade não apenas no Carnaval, mas em todos os eventos – dentro e fora do país – em que o Ilê participa. Os critérios para a escolha da Deusa passam pela beleza, desenvoltura na dança e conhecimento sobre a história da bloco e sua política de afirmação cultural. A festa deste ano teve como convidado especial o sambista carioca Arlindo Cruz.

  

Ilê Aiyê e sua missão

Patrimônio da cultura baiana e um marco no processo de re-africanização do Carnaval da Bahia, o Ilê Aiyê tem como missão “difundir a cultura negra na sociedade, visando agregar todos os afro-brasileiros na luta contra as mais diversas formas de discriminações raciais, desenvolvendo projetos carnavalescos, culturais e educacionais, resgatando a auto estima e elevando a nível de consciência crítica, através do lúdico”.

Como diz Antonio Carlos Vovô: “Somos o afro pioneiro do Brasil e temos como visão sermos um bloco de referência que, com muita competência e muito saber, expande na contemporaneidade a tradição aprendida".



*Antônio Moreno é jornalista e também assessor de imprensa do Ilê Ayê.
Fotos: Sídio Júnior




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