domingo, 18 de dezembro de 2011

Senta lá, Negalora

TELEANÁLISE



Sentinela - Malu Fontes*


As repercussões rasas e descartáveis que sucederam alguns episódios midiáticos recentes ocorridos na Bahia, como o caso mulher ketchup, o projeto de lei que propõe impedir o governo baiano de contratar, com recursos públicos, bandas de pagode cujo repertório seja ofensivo às mulheres, a suposta relação entre os shows promovidos na praia por programas populares de TV e os arrastões realizados em locais próximos à festa e, mais recentemente, o bafafá em torno da estética e da nomenclatura Negalora, adotada por Cláudia Leitte, sob a chancela de Carlinhos Brown, não passam de mais do mesmo, de fumaça sem fogo.

PIN UP - Cláudia Leitte em si já é um fenômeno midiático no mínimo difícil de ser enquadrado. É um produto do business fonográfico, construído passo a passo diante dos holofotes, desde os primeiros passos públicos, como a Lolita da banda Babado Novo. Uma década depois, muito investimento em marketing e um processo poderoso de agenciamento da aparência e da carreira a transformaram em um fenômeno polvo. Pouco se fala do seu talento musical. As informações que saltam aos olhos sobre seu estrelato centram-se nas referências celebratórias à sua beleza e ao seu vigor corporal de uma Barbie contorcionista de palco, à sua força atual de mascate publicitário que só anuncia menos coisas à venda que Ivete Sangalo, à sua imagem de pin up gostosa de calendário.

Ao mesmo tempo, a cada entrevista, ela própria ressalta com tintas fortes os valores tradicionais da maternidade, da família e da religião. Numa frase sim e na outra também cita a família, Deus, Jesus e a fé. Quando se trata de valores morais, chega a resvalar no conservadorismo, ou pelo menos assim é interpretada. Já chegou a ser execrada nas redes sociais por grupos gays, que a acusavam de homofobia por ter dito numa entrevista que preferia que seu filho fosse macho. Nos últimos dias, Cláudia Leitte voltou a ser alvo de uma saraivada de críticas por ter se transformado na personagem Negalora, batizada por Carlinhos Brown.


NEGUINHA - Com outdoors espalhados por toda Salvador estampando fotos em que a cantora aparece mesclada, com um lado do rosto loiro e outro negro, batizando um show acústico e a gravação de um DVD batizados de Negalora, Cláudia Leitte meteu a imagem na cumbuca da reação irritada das diferentes tendências do movimento negro. Se os termômetros adotados para avaliar a reação da opinião pública forem as redes sociais, a ideia que se tem é a de que o neologismo tornado alcunha de Cláudia por Brown para o show foi usado como combustível para reacender a ira do movimento gay pelas declarações do passado, agora acrescidas de reações raivosas de quem acha um desrespeito à cultura e à música negra esse tipo de mimetização de cantoras brancas que adotam o mantra ‘eu sou neguinha’.

ARQUIBANCADA - Vale ressaltar, no entanto, que a reação contra Cláudia Leitte deve esconder mais restrições estéticas do que parece fazer crer a superfície das falas. Para bom entendedor, é claro que o barulho não se trata apenas de uma condenação ao fato de se tratar de uma branca invocando referências negras, e sim a um não reconhecimento, na performance da cantora, por boa parte do público que se afina à musicalidade afro, dessas referências reivindicadas pela Negalora. Se o nome do que cobram da moça é talento, que digam. No entanto, em tempos de politicamente correto, além de temer dar nome às coisas, soa muito mais ‘do bem’ aliar-se em defesa de causas políticas e sociais. Não demora e aparece um ação judicial mandando a moça limpar a maquiagem do lado negro da foto.

Não fosse isso, então, o que explica o fato de Daniela Mercury, e nem faz tanto tempo assim, ter se autodenominado como a neguinha mais branquinha da Bahia, na época em que O Canto da Cidade tornou-se praticamente o hino de Salvador? Se houve reação semelhante, onde está registrada a repercussão disso? O fato é que, sobretudo em Salvador, há diante de Ivete Sangalo, Cláudia Leitte e Daniela Mercury um público de súditos que se comporta como uma arquibancada do Ba-Vi. E nessa guerra de torcidas, Daniela Mercury é que fica melhor na fita quando se trata dos gays e dos defensores da preservação da cultura negra.

SENTA - Mas, independentemente das razões que legitimam a aceitação da neguinha de Daniela e a reação à Negalora de Cláudia Leitte, não deixa de ser irônica a ira do tipo purpurina de alguns diante de embates dessa natureza. Há falas na imprensa e sobretudo em artigos e pontos de vista em circulação nas redes sociais que, se lida desatentamente, fazem acreditar que há fronteiras culturais da boa e da má música, da legítima e da ilegítima e que devem ser respeitadas como sei, como se a geléia geral da indústria cultural e da cultura de massa há décadas já não tivesse passado um trator por cima de quaisquer filtros autorizadores quando a questão é dizer quem pode ou não pode cantar isso ou aquilo, assim e assado.

Onde está essa pureza cultural com fronteiras que não podem ser ultrapassadas sob o risco de o infrator ser acusado de compurscar e macular áreas intocáveis e sacralizadas dessa e daquela cultura? É tudo pastiche e assim será. No chão da arte, o restinho de sagrado que resta é o talento de poucos, coisa que importa cada vez a menos gente. Se há quem acredite numa ainda pureza cultural que autoriza uns e cospe em outros, Senta lá, Cláudia.

*Malu Fontes é jornalista, doutora em Comunicação e Cultura e professora da Facom-UFBA. maluzes@gmail.com

Maestro Zeca Freitas e Orquestra de Todos os Santos encerram XVII Festival de Música Instrumental da Bahia


Sentinela – Antonio Nelson


Os ritmos da melodia baiana com o swing afro, o samba, e a fusão eletrônica estão na apresentação da Orquestra de Todos os Santos, do maestro Zeca Freitas, no último dia do XVII Festival de Música Instrumental da Bahia, no Teatro Vila Velha – Passeio Público, às 19h, por apenas R$1 (meia), R$2(inteira).

A captação dos “santos”, das diversas regiões do país, ou seja, quer explorar, reinventar, misturar, corromper etc. o maxixe, o maracatu, o frevo, o samba, funcky carioca e outros gêneros.

Contudo, para Zeca, a Orquestra tenta produzir o som da modernidade: ka-ópticos, tecno-ilógicos, multimidiáticos, globali(le)sados e instantâneos. O “OTS” tem a sensibilidade de captar plagas – santos – mundiais, com o intuito de compartilhar sons universais.

Sem intermitências com maestro Gil Santiago

Sentinela - Antonio Nelson

As vozes da Soterópolis me convidam! Meu diálogo não intermitente do último sábado (17/12/11), além do Grupo Triat’uan, foi com o maestro da Orquestra Afro Sinfônica, Gil Santiago. Gil partilhou comigo com exclusividade sua trajetória na música e inquietações com a contracultura soteropolitana.

Na década de 1990, aos 17 anos Gil Santiago tocava na banda Tambores Urbanos. De acordo com ele, momento especial na história do Samba Reggae na Bahia. Bacharel em música na UFBA (Universidade Federal da Bahia), Gil se tornou o primeiro negro da Orquestra Sinfônica da Bahia, além de conquistar formação na Universidade.

Seu pai, o sergipano Messias Santiago, de origem pobre, migrou para a cidade do Salvador para o bairro da Boca do Rio. Messsias se tornou, com muito empenho, petroleiro da Petrobras. Foi morar no bairro nobre do Stiep. Mas foi na Boca do Rio, que Gil, tocava lata na comunidade. Aos 17 anos, Gil começou nos Tambores Urbanos. A ascensão de Gil, através da identidade africana, se tornou mais visível para os que “não” tem ouvidos para escutar, na regência da Orquestra Afro Sinfônica.

Gil assevera que seu empenho lhe proporciona prazer, principalmente com o Projreto de Educação Musical, que é realizado no município de Camaçari, na Bahia, valorizando a identidade étnica. “São 50 músicos. O Centro Cultural da Cidade do Saber distribui o aprendizado das melodias em 15 pólos. Entre 2.500 a 5.000 crianças e jovens, do ensino fundamental, de sete a 15 anos estão com oportunidades transformadoras. Cordas, sopros e percussão, e tem iniciação musical com canto coral”, declarou emocionado.

Gil se dedicou em aprimorar a acuidade com o vibra fone e regência. Mas se assunto é contracultura baiana, ele ressalta que por razões econômicas a indústria cultural do axé music produz o processo de embranquecimento dos negros. “A música afro não propriedade nossa. Mas, vemos brancos neste cenário tocando o pagode original para apenas vender”, salientou.

Para Gil é indispensável que os artistas baianos aglutinem forças para celebrar a vida ao som da diversidade que a Bahia tem, seja através do contato direto, com shows nas ruas da capital baiana, pela internet – rompendo as barreiras da grande mídia, e em mobilização da Salvador oficial para o Brasil e o mundo. Fica aí a dica...

Grupo Triat’uan traz recordações do Jazz e da Bossa Nova na Bahia

Sentinela - Antonio Nelson


J
á que no repertório estão o Jazz e a Bossa Nova na Bahia, as recordações da difusão destes gêneros viajam para a década 1980, no Rio Vermelho, bairro boêmio da cidade do Salvador. Nítidas na memória afetiva do Grupo Triat’uan, composto pelo violinista e arranjador Edu Fagundes, do também violinista, e saxofonista Luciano Chaves, e do ícone da percussão baiana e brasileira Antonio da Annuciação. A ascensão e “queda” na capital baiana do som instrumental ocasionou pouco espaço na cidade e na grande mídia.

De acordo com o Triat’uan, grupo consagrado na música instrumental da Bahia, a efervescência no Rio Vermelho acontecia nos bares Clave de Sol, Dama da Noite, Bilhostre; e Ebony, no bairro da Pituba.

Para eles, Salvador viveu o clímax do som instrumental. Bossa Nova, Chorinho, Samba, e harmonia negra norte-americana.

Edu Fagundes também toca clarinete. Lecionou no Liceu de Artes e Ofícios e na Academia de Música da Bahia (AMBAH). Já Luciano Chaves, com apenas 11 anos, tocou flauta doce na Orquestra Sinfônica de Camaçari, sob o solo do concerto de Bach.

Edu e Luciano já tocaram na banda Terra Samba, Pinel; com os cantores Ricardo Chaves e Emanuele Araújo.

Annunciação tocou bateria por mais de 15 anos com Hermeto Pascoal. Residiu em São Paulo propagando o som do bongô e outros instrumentos percussivos. Com 73 anos, Annunciação denuncia muita vitalidade no palco, ao lado dos amigos Edu e Luciano.

O Triat’uan realizou apresentação do seu primeiro CD, Caminhos do Vento, no último sábado (17/12/11), no XVII Festival de Música Instrumental da Bahia, no Teatro Vila Velha – Passeio Público.

Por apenas R$1 (inteira), e R$2 (inteira), a platéia assistiu seis músicas do Caminhos do Vento, lançado em setembro de 2011. Edu destaca a composição Kuai, que se origina do hexagrama do I Ching. Kuai está no gênero do Jazz. Questionado sobre a importância do ensino da música no ensino público, Edu declarou: “música propicia prazer. Abre a cabeça. É indispensável o estudo da música nas escolas”.

Edu enfatiza que a materialização do CD Caminhos do Vento se deu após o incentivo da Fundação Cultural.

O Triat’uan dispõe as composições no myspace: Caminhos do Vento, Bêbado na Chuva etc. estão na rede.

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