Do Estadão
Contador de 45 anos, dono de um patrimônio declarado inferior a R$
200 mil, é a peça que falta para as investigações da Operação Monte
Carlo, que levou à prisão Carlos Augusto Ramos e mais 79 pessoas no dia
29 de fevereiro
Alana Rizzo
Há 145 dias a Polícia Federal procura Geovani Pereira da
Silva. O contador de 45 anos, dono de um patrimônio declarado inferior
a R$ 200 mil, é a peça que falta para as investigações da Monte Carlo -
a operação que levou à prisão Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos
Cachoeira, em 29 de fevereiro, além de outras 79 pessoas.Segundo
a denúncia do Ministério Público Federal, Geovani era responsável por
receber o dinheiro arrecadado do jogo ilegal e fazer pagamentos da
organização criminosa. Calcula-se que a movimentação da quadrilha
chegou aos bilhões de reais.
"Homem-bomba é o
Carlinhos Cachoeira. Não é o Geovani", responde o advogado Calisto
Abdalla Neto, responsável pela defesa do contador, às pressões de
parlamentares da CPI para que seu cliente deponha.
Desaparecido,
surgiram boatos de que ele estaria negociando uma delação premiada. O
advogado nega: "Se ele fala, acorda morto. Ou morre antes mesmo de
falar". Dados remetidos à CPI mostram que os rendimentos declarados de
Geovani não combinam com sua elevada movimentação financeira.
"Ressalta-se
que os rendimentos foram recebidos de pessoa física", diz a nota
técnica da Receita Federal sobre o funcionário de Cachoeira, que tinha
trânsito livre no Laboratório Vitapan e no escritório da Delta em
Goiânia. Os valores não passam de R$ 21,3 mil e seu maior patrimônio
teria sido registrado em 2009, quando declarou R$ 197,5 mil em bens e
R$ 110 mil em dívidas. Naquele ano, Geovani teria comprado cinco
carros. Em compensação, teria movimentado R$ 3,1 milhões. No ano
seguinte, R$ 4,3 milhões.
Extratos do Banco Itaú
também obtidos pela CPI descrevem a passagem milionária de valores
pelas contas do contador. Os registros mostram, por exemplo,
transferências de R$ 2 milhões em um único dia. O dinheiro tem destino
certo: outras contas de Geovani, integrantes da quadrilha ou laranjas.
Rapidez.
Nas mais de 250 mil horas de gravação da Monte Carlo, as conversas de
Cachoeira com Geovani são rápidas e tratam exclusivamente de ordens de
pagamento. "Mandou 23? Não. Manda 33 e põe 10 mil de crédito para mim",
diz o contraventor ao contador que, além de livros-caixa online, tinha
uma grande quantidade de registros em papel. Parte foi apreendida pela
PF e parte está sendo periciada.
Em 3 de março de
2011, durante a negociação da venda da casa do governador Marconi
Perillo, Cachoeira liga para o contador e pede "600, 500 e 400. O
Cláudio sabe". Dias antes era Geovani que confirmava ao chefe o
pagamento do arquiteto Alexandre Milhomem, responsável pela reforma e
decoração na casa de Alphaville. Em outra conversa, depois de uma briga
com a namorada, Cachoeira pede para Geovani depositar R$ 35 mil na
conta de Andressa (Mendonça).
Técnico em
contabilidade, Geovani morava em um bairro de classe média em Anápolis
(GO). Em um dos áudios da operação, é questionado sobre como é
trabalhar 18 anos com Cachoeira. "Toda vida ele foi assim (difícil de
bater papo), mas entende tudo que você está falando", responde ao
presidente do PT do B municipal, Sérgio Morais. Morais tinha planos de
levar Geovani para a vida pública ainda neste ano. Na mesma ligação, os
dois falam sobre a disputa pela prefeitura ou por uma possível vaga na
Câmara Municipal de Anápolis.
O presidente do PT
do B também diz que Geovani deveria tomar cuidado: "Com tantas ligações
do poderoso, a PF já deve estar atrás de você". Em outra conversa é
Cach0eira que pede precaução a Geovani, pois temia estar sendo
grampeado.
Jantar. Em 28 de fevereiro, véspera da
Monte Carlo, integrantes do grupo, entre eles Cachoeira, conversavam
sobre uma possível operação da PF. O último registro telefônico entre
ele e Cachoeira é mais uma ordem de pagamento, às 14h56. Geovani
desapareceu naquela noite. Saiu para jantar com a namorada, deixou-a em
casa e não voltou mais. Todos os outros denunciados foram presos.
Mãe
de Geovani, Dalila disse que não poderia falar por orientação do filho
- mesma resposta da namorada. "É muito difícil. Tem que ter muita
tranquilidade para lidar com a situação", afirmou Dalila ao Estado.
Conhecido
na cidade, moradores de Anápolis dizem que Geovani ficou "proibido"
depois que sumiu. "Todo mundo tem medo de a polícia achar que ele está
escondido aqui. Ninguém nem toca no nome dele", avisa um morador do
bairro onde o contador cresceu.
A defesa de
Geovani diz que "ele está escondido, esperando que a Justiça lhe
conceda a liberdade para poder se defender". O contador estaria em
Goiás, mudando de endereço vez ou outra para evitar a prisão, mas
mandando recados para a família sempre que possível.
Em
10 de junho, data do seu aniversário, teria cogitado um encontro com a
mulher e os filhos. Com o advogado, Geovani esteve duas vezes. "Hoje
não tenho mais contato. Não posso prejudicar o meu cliente. Por isso,
nossa defesa é técnica. Não tenho como conversar com ele", diz o
advogado Abdalla Neto.