sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Entrevista: O multiculturalismo da música baiana com Davizinho de Mutá e Hamilton Reis

"Aqui, eu sei que o setor empresarial não está nem aí para o samba-de-roda, quer algo que lhe dê um retorno imediato. E tem lá a mulher toda enfiada, a que rala". Davizinho de Mutá.
Sentinelas - Maísa Amaral e Antonio Nelson*

Davizinho de Mutá/vocal e Hamilton Reis/vocal/violão são os líderes do grupo de samba-de-roda, baiano, Barlavento.

O Buraco de Maroca - É uma história verídica, em ourives. Os banhos que Davizinho de Mutá tomou no buraco de maroca, em Ourives, Mutá, em Salinas da Margarida, foi tão marcante que virou título e música do mais recente CD do Barlavento.

As músicas do show têm a raiz do trabalho de Mutá, em Salinas.

Sentinelas da Liberdade - Poderia falar da trajetória do grupo Barlavento?

Hamilton Reis – Já temos mais de 15 anos de estrada. Como Barlavento, lançamos o primeiro CD, O Buraco de Maroca. Mas com a antiga formação, que era com o Barravento, lançamos dois CD´s. Desse grupo, uma parte fundou outro grupo e nós prosseguimos com o Barlavento.

Acha que existe dificuldade para divulgação do grupo, apesar da Bahia ter uma forte raiz no samba-de-roda?

Davizinho de Mutá e Hamilton Reis - Gostaríamos que o samba-de-roda tivesse mais espaço, principalmente para o trabalho desenvolvido pelo Barlavento. Um trabalho musical feito com pouquíssimas adaptações. Respeitamos muito a pureza do estilo musical, é uma música de domínio público, ancestral. Poderíamos inclusive ir ao exterior representando a Bahia, em festivais, feiras e congressos, o que está acontecendo, mas de uma maneira independente, sem apoio oficial. Então vai ser muito bom quando tivermos apoio para ampliar a divulgação da Bahia.

Na medida do possível, acreditamos que temos divulgação, o que não ocorre é o interesse de grande parte da população, que anda fascinada por outro gênero da música baiana. Então, acreditamos que isso prejudica o samba-de-roda. Aqui no Brasil isso é muito visível. Tivemos a oportunidade de ir três vezes à Espanha, também a França, Inglaterra, Polônia e Portugal, mas nunca o grupo foi ao Rio de Janeiro, a Sergipe, Pernambuco ou outro estado qualquer do Brasil. Sentimos que o samba-de-roda ainda é discriminado na sua origem.

Como foi a turnê que o grupo acabou de fazer em Portugal e na Polônia?

Davizinho de Mutá e Hamilton Reis - Foram sete cidades em Portugal. Tocamos no primeiro carnaval de Portimão, uma cidade importantíssima de Portugal, turística, forte, considerada a de melhor qualidade de vida, onde ocorreu o primeiro carnaval da Bahia, e tocaram poucos representantes da Bahia. Fomos convidados. Fomos de maneira independente e nos apresentamos. Isso é ótimo, porque no carnaval da Bahia gostaríamos de ter mais visibilidade, em um trio elétrico, na imprensa. São experiências enriquecedoras, onde as pessoas estão vendo uma cultura diferente da delas e respeitam muito bem. Uma cultura alegre, que vem do sofrimento, mas que gera depois alegria.

Como estão as apresentações até o final do ano? Já tem a programação dos shows?

Hamilton Reis - Estamos com apresentações programadas no Teatro Sesi, Rio Vermelho, em Salvador-BA, uma casa que tocamos há seis anos. São pequenas temporadas. Esperamos manter essa temporada nos próximos meses. Temos alguns projetos como um show que estamos preparando no Theatro XVIII, no Pelourinho, também em Salvador, para o próximo ano.

Por que Barlavento?

Hamilton Reis - Barlavento significa a direção do vento. Para onde o vento sopra. Colocamos esse nome para não se afastar do sentido do primeiro grupo formado que era Barravento.

Vocês disponibilizam no site e no MySpace, músicas e vídeos do grupo. Isso tem sido um elemento facilitador para divulgar o trabalho?

Hamilton Reis - Muitos grupos, inclusive os artistas com dificuldades, quanto à visibilidade, que é o nosso caso, estão disponibilizando o material na internet. O nosso CD está todinho no nosso site, e também no multipenha, para quem quiser baixar e escutar, pois é uma forma de divulgação. Existe uma rádio na suíça que você escutar as nossas músicas, por sinal ficamos em primeiro lugar por dois meses. Rádio: x.stag.com.


Muitos grupos musicais ricos culturalmente não são conhecidos pela população local. Na opinião do grupo, o que está acontecendo?

Davizinho de Mutá - Isso é um processo lento de educação, de civilização. A nossa missão com a música é para mostrar que existe uma história brasileira através da música. Cultura, música, Brasil. A luta dos escravos e dos índios... No nosso caso, ocorre através do samba-de-roda. Agora é um processo lento, que acredito que adiante terá mais visibilidade, pois outros paises vão apreciar e a repercussão será maior. O samba-de-roda é patrimônio da humanidade, tombado pelo Unesco.

Aqui, eu sei que o setor empresarial não está nem ai para o samba-de-roda, quer algo que lhe dê um retorno imediato. E tem lá a mulher toda enfiada, a que rala. Estamos em um estágio triste.
*Maísa Amaral e Antonio Nelson são da equipe do Sentinelas / Foto: Antonio Nelson.

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