segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Edir sucede Sarney na fita

TELEANÁLISE

Sentinela - Malu Fontes*
maluzes@gmail.com

Os protagonistas dos escândalos no Senado tiveram razões de sobra para começar a semana louvando o chefe mor da Igreja Universal do Reino de Deus, o ‘bispo’ Edir Macedo, caído em desgraça no circuito noticioso por acusações feitas pelo Ministério Público de São Paulo de formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. Como no Brasil os escândalos não têm desfechos, para empalidecerem precisam sempre de um outro. Calhou, portanto, de ser justamente o bilionário bispo Macedo a entrar em cena com um novo escândalo para dar algum sossego aos bigodes tinturados de José Sarney nas principais manchetes dos jornais e telejornais.

Não sem alvoroço e barulho, a Rede Globo, a Band, os jornais O Globo e a Folha de S. Paulo fizeram a cobertura das acusações contra Macedo. Os dados não são frágeis e a imprensa sistematicamente atacada por processos da IURD teve material de sobra para contar em detalhes o que supostamente há de podre sob os tapetes vermelhos dos templos universais. A Globo não perdeu a oportunidade de re-exibir o vídeo em que Macedo, informal e numa partidinha de futebol em Salvador ensina ironicamente a como tirar dinheiro falso dos desesperados com problemas terrenos. No vídeo exibido, o bispo tripudia até mesmo do cajado de Moisés que teria feito uma rocha brotar água pura. Quem conhece a briga contínua e histórica entre a Universal e Globo/Folha/Band sabe que exibir e narrar acusações contra Macedo, ainda por cima ancoradas em dados do Ministério Público, equivale a manifestações orgásticas dessas organizações.

DIABO - As acusações apresentadas pelo Ministério Público paulista à Justiça baseiam-se em dados da Receita Federal e do COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), órgão do Ministério da Fazenda que combate a lavagem de dinheiro. Com base em tais informações, o MP calcula que somente a movimentação financeira suspeita feita pelo bispo e mais nove executivos do seu grupo soma R$ 4 bilhões de 2003 a 2008. Diz-se que o diabo mora é nas sutilezas. E foi nas sutilezas que, sofisticadamente e de modo indireto a Globo deu de modo desfavorável o espaço que o jornalismo sempre deve dar aos acusados, o tempo para a defesa.

A defesa de Macedo apareceu no Jornal Nacional na voz do advogado do bispo e da turma da IURD, Artur Lavigne. Um dos maiores criminalistas do Brasil e também conhecido por ser o pai de Paula Lavigne, ex-mulher de Caetano e hoje um dos nomes mais poderosos do show business brasileiro, Lavigne surgiu no JN titubeante, reticente e quase gaguejante, com assertividade zero em suas declarações. No contexto, sua fala soou quase um eco da fala dos senadores do Conselho de Ética do Senado. Disse que, certamente, como já aconteceu outras vezes, as acusações contra seus clientes são recorrentes e irão dar no que sempre deram. Em nada, em arquivamento. E tudo foi repetido com esmero no Jornal da Globo e em outros espaços das Organizações Globo. A Band fez uma cobertura tão contundente quanto. Já Sílvio Santos e seu SBT bem que merecem uma prece dos fiéis da IURD pela superficialidade que caracterizou sua cobertura do episódio.

Para aquém ou além das denúncias contra Macedo, no Senado, a crise aparentemente arrefeceu, mas está longe de acabar. As chantagens pesadas nos bastidores entre PMDB e PSDB continuam e, graças a elas, dificilmente Sarney larga o osso. No último round, como sempre, o brasileiro viu pela TV o quanto ele é tomado por seus representantes como um asno imbecil. Sempre que um inescrupuloso do Senado é forçado a entrar em cena por, no jogo das chantagens, ser jogado às câmeras e manchetes, vem uma sentença de idiotice contra o eleitor. A semana começou com o prêmio peroba pulando das mãos de Arthur Virgílio (PSDB-AM), pego de calças curtas sucessivas vezes enquanto apontava o dedo justiceiro para Sarney e companhia, para as de Sérgio Guerra (PSDB-PE).

CÂNCER – Guerra foi acusado de viajar para os Estados Unidos acompanhado da filha numa temporada generosa e financiada com dinheiro do Senado. Como se fosse a coisa mais natural do mundo, com um jeito meio gatão de meia idade de olhar oblíquo, o senador não titubeou. Disse que não fez nada de errado. Foi aos EUA tratar de um câncer no estômago, um problema de saúde, portanto, e que é um direito seu não só buscar tratamento como levar acompanhante. Traduzindo para o real, o que fica é a clareza de que o brasileiro elege representantes que se sentem no direito de, diante de um problema de saúde, bater asas para fora do país às custas do poder público.

Enquanto isso, quem paga a fatura dos privilégios das autoridades fica sujeito a penar horas em filas hospitalares para comumente ficar sem atendimento. Uma cena reveladora do quanto o governo perdeu a vergonha da saúde que não oferece à população é uma peça publicitária institucional do Governo da Bahia em que um habitante do município de Paripiranga, sem dentes, aparece sorrindo e elogiando o governo pela chegada da luz elétrica. É o país dos banguelas dizendo, mesmo quando não quer dizer exatamente isso, que não ter dentes é tão natural que os desdentados são garotos propaganda orgulhosos do sucesso de uma gestão.


*Malu Fontes é jornalista, doutora em Comunicação e Cultura e professora da Facom-UFBA.

Um comentário:

  1. Beleza de artigo. Só entendo que o dinheiro dos desesperados não é dinheiro falso. É suado e sofrido. E que captação de poupança popular sem registro da instituição no Canco Central do Brasil é crime tipificado em lei. E o que dizer de confisco pemanente desse suado e sofrido dinheirinho? E por falar em dinheirinho, o dinheirão que Roberto Marinho recebeu das grandes corporaçãoes capitalistas internacionais para ajudar o capital estrangeiro a se apoderar do Brasil e do governo do Brasil também tem o nosso suor e o nosso sangue, mas é mais sujo do que o dinheirinho do rebanho. Virou moda no Brasil bandido brigar com bandido. Há ringues dessas lutas no STF, no senado, em toda parte.

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