domingo, 30 de outubro de 2011

Kadafi, Rafinha e Lula

Estreia



Ecos do Silêncio



Sentinela - Gabriel Pinheiro*




Lula com câncer, Kadafi morto e Rafinha Bastos fora do CQC, porém mais cotado do que nunca. O que esses três assuntos têm em comum? Todos tratam de questões que envolvem impasses provocados por debates ideológicos. Um passeio pelos meios de comunicação de massa, aliado a um sobrevôo pelas redes sociais nos oferecem um termômetro da opinião pública sobre esses assuntos. Sobre o que pensa a opinião pública? Não necessariamente, mas sim, sobre o que ela diz pensar.


Salvo raras exceções, as mensagens de solidariedade ao presidente pululam em cada post do Facebook, são curtidas e compartilhadas, com comentários agregados de admiração. Kadafi, quando morto, o tirano vilão, erigido como novo pilar do eixo do mal, foi alvo de festejos, afinal, um tal facínora vivo era algo quase que repulsivo às mentes sadias, democráticas, de direito. Quanto a Rafinha, por mais pueril, ainda mais notória se fez a comunhão de pensamentos. O rapaz passou dos limites, vociferavam todos, fazendo eco, sem notar, a uma censura ainda pior que a política, uma censura plutocrática, na qual o verdadeiro crime não é o que se diz, nem tanto contra quem se diz, mas sim quanto possui, em pecúnia, poder e influência capitalista, o alvo da chicana. Jô Soares, com sua capacidade de personificar o pensamento do rebanho, a dita realidade social, resumiu: “Não pode haver limites para o humor, mas para a grosseria sim”.


Acontece, que esta não me parece ser a realidade social, de fato, mas sim uma realidade social construída. À época do frissom maior sobre a questão Rafinha, postei no Facebook uma defesa ao humorista, incluindo nela uma crítica aos que faziam coro nas acusações sem se dar conta de que se associavam aos censores plutocratas. Dois ou três amigos curtiram essa publicação e, um ou dois comentaram, com evasivas, quase a me censurar também.

A opinião é livre e tem de ser, nada contra isso, muito pelo contrário. A verdadeira questão para mim é até que ponto essas pessoas, que assim se expressam, de fato pensam assim ou apenas querem que acreditem que elas assim o fazem? Levando em consideração a mecânica própria das redes sociais, sou levado a supor que a segunda hipótese esteja mais próxima da verdade. As pessoas querem, como propunha a música, “ter um milhão de amigos, e bem mais forte poder cantar”. Na rede, essa amizade se expressa basicamente por concordâncias, expressas no que é coletivamente curtido, compartilhado. É comum encontrar em diversos posts a recomendação “se você também pensa assim, compartilhe no seu mural”.

A espiral do silêncio, teoria proposta em 1972, durante o 20º Congresso Internacional de psicologia, pela pesquisadora alemã Elisabeth Noelle-Neumann, parece aplicar-se à perfeição nesse contexto. Os indivíduos das redes buscam a integração social através da observação da opinião dos outros, expressando-se dentro dos parâmetros da maioria para evitar assim o isolamento. O medo da solidão social é tão forte que se propaga em espiral, escondendo o desejo de mudança daqueles que, sem o saber, podem compor uma verdadeira maioria silenciosa.

Como assim maioria?, podemos nos perguntar, afinal tudo que é dito na rede contradiz essa versão. Esse dito, em face do não dito, caracteriza a acumulação, a exposição excessiva de determinadas idéias, através, por exemplo, dos compartilhamentos, que, por outro lado, ressalta ainda uma consonância, vez que o máximo que se faz, ao partilhar, é acrescer comentários de reforço à mesma idéia central. Presente em todos os murais, de todos os amigos, e ainda na mídia comum, temos aí uma verdadeira ubiqüidade midiática. Acumulação, consonância e ubiqüidade são justamente os três mecanismos condicionantes da espiral, conforme Noelle-Neumann. É uma onda, ou – já que estamos falando do facebook, mais um anglicismo que absorvemos sem sequer pensar - uma Wave. E, de fato, velho Tom, para os facebookianos parece mesmo que “é impossível ser feliz sozinho”.




*Gabriel Pinheiro é Jornalista e Analista de Comunicação do Ministério Público do Estado da Bahia. Já atuou como redator, repórter, editor, apresentador e professor de Jornalismo e Relações Públicas. Escreve toda semana a coluna Ecos do Silêncio para o Sentinelas da Liberdade.

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