sábado, 11 de julho de 2009

DUAS FORMAS DE OLHAR A VIDA


Sentinela - Luiz Humbert* (Lalado)



Vale à pena acreditar na existência de Cristo e na existência de Buda. No mínimo, tudo que se disse a respeito da personalidade deles e da vida que levaram nos serve de exemplo e de parâmetro, quando nossas ações são para mudar a sociedade insustentável e evitar que o mundo continue caminhando para um triste fim.

Cristo e Buda são dois modos distintos de encarar a realidade.

Cristo não tinha planos para esta vida. Sabendo que toda a autoridade é prejudicial à vida, Cristo buscou a libertação na dor, acolhendo-a com alegria e resignação, acreditando que a personalidade humana se eleva na dor. Portanto, Cristo não se insurgiu contra a autoridade. Sujeitou-se à autoridade imperial de Roma e à autoridade eclesiástica da igreja judaica, sem usar os seus divinos poderes e força para se defender da violência imperial e religiosa. Cristo não tinha planos de reformar ou de reconstruir a sociedade.

Cristo pregava contra a ambição insana dos poderosos com uma atitude serena, a mesma atitude de Gandhi contra a violência do império britânico, atitude estóica que veio a se chamar de resistência pacífica. Atitude positiva, que é muito diferente da permissividade atual de todos os omissos, passivos e indiferentes à realidade social, que, por ambição ou covardia, se tornam cúmplices da violência das classes dominantes, que gera todas as demais formas de violência social e ambiental.

Ao contrário de Cristo, Buda só tinha planos para esta vida. Planos de substituir a sociedade plutocrática segregacionista por uma nova sociedade instituída em bases igualitárias, uma sociedade comunitária, livre da fome, da pobreza material, da pobreza espiritual e do sofrimento. Portanto, Buda desenhou e fortaleceu o caminho para uma nova sociedade livre de hierarquia e de competição; uma nova sociedade baseada na solidariedade natural entre irmãos.

Seiscentos anos antes de Cristo, Buda intui que a suposta divindade criadora de todo universo é apenas energia imaterial, sem conteúdo e sem forma, de onde tudo que é material vem e para onde tudo que é material vai. E que essa “divindade suprema”, a energia imaterial, está em cada corpo do universo, em todos os corpos minerais, vegetais, animais, humanos e culturais. Portanto, a lei suprema é amar a si próprio sobre todas as coisas e ao próximo, todos os próximos, de todos os reinos da natureza, como a si mesmo.

Seiscentos anos depois de Buda, Cristo, filho de Deus, ensinou que Deus está no paraíso, bem distante de nós e dessa vida, e que a lei de Deus se resume a um só mandamento: amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo.

E nós, praticantes budistas da Casa da Aranha, nos propomos realizar pacificamente a revolução de trazer Deus de volta ao homem e à natureza.. Propomo-nos a seguir esse caminho revolucionário. Nós acreditamos no projeto budista de reconstrução da sociedade. Nós queremos agir pacificamente para acabar com a pobreza e com toda a dor e sofrimento que ela acarreta. Nós acreditamos no socialismo de Antonio Conselheiro, de Simon Bolívar, de Gaspar Francia e na Ciência Holística como métodos revolucionários.Em vez do individualismo competitivo, vivemos o individualismo solidário, cuja expressão é a alegria.

Como disse o poeta inglês, “a dor não é a forma suprema de perfeição. Meramente provisória, a dor é um protesto. A dor está presa aos meios iníquos, doentios e injustos. Quando a iniqüidade, a doença e a injustiça forem erradicadas, não haverá mais lugar para a dor. Porque o que todos nós buscamos não é o sofrimento, mas o prazer. O supremo prazer de viver intensamente, sem oprimir o nosso semelhante, nem por ele ser oprimido. Queremos que todas as nossas atividades sejam agradáveis e em benefício de todos. Os gregos tentaram o bem comum, mas não o alcançaram, a não ser no mundo das idéias, porque eles tinham escravos e os alimentavam. A Renascença também tentou, mas também não alcançou, porque eles tinham escravos e os deixava morrer de fome”.

Cristo nasceu pobre e viveu entre os humildes. Buda nasceu rico, abandonou os seus palácios e passou a viver na simplicidade de uma vida comunitária, plena de alegria, felicidade e realizações. Exemplo e modelo para todos nós, inconformados com a violência da desigualdade social, insatisfeitos com a miséria e a insegurança de nossa sociedade atual.

O que Cristo e Buda tinham em comum é ter se despojado de tudo que possuíam ou de tudo que poderiam vir a possuir, para que nada faltasse ao seu irmão. É precisamente esse o nosso melhor compromisso, o nosso grande desafio.

Cap. 9 - pág. 36-37 do Livro Eletrônico: O Caminho da Casa da Aranha
*Luiz Humbert (Lalado) é praticante budista e letrista do GRAMPO: http://www.gramporock.blogspot.com/

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